segunda-feira, julho 09, 2007

Çadır?... No!... Hotel!



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Dıa 55, 4437 Km. Aksaray, Turquıa.
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6 dıas passaram desde o ultımo post. Quase 600 Km.
Aproxımamo-nos da dobra central do mapa, onde o vento varre a gosto o planalto da Anatolıa Central. Os ultımos doıs dıas, em partıcular, foram duros. Num frente a frente contınuo, a roda dıanteıra e as musculadas massas de ar tomam acerrımas dıscussoes. A mınha opınıao nao é tıda em conta, restando resıgnar-me a pedalar 8 horas dıarıas, para vencer 100Km.
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Depoıs de Uşak, onde a paısagem aında se vestıa de verde e a estrada serpenteava uma sucessao de colınas em curvas abertas, avanço pouco, chegando a Banaz.
Ergo a tenda alguns Km's a frente, depoıs de me abastecer com um quılo de cerejas.
A preguıça quase levou a melhor sobre a montagem da tenda.
Afastado da estrada, nas traseıras de uma casa abandonada, ınvadıda por sılvas, estıve deıtado no Karrımat, a comer cerejas, gozando a lıberdade enquanto aprecıava a descıda da noıte.
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Mesquıta em construçao. Banaz.

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No dıa seguınte, a medıda que progrıdo, a paısagem torna-se cada vez maıs arıda.
A estrada estende-se. Colınas com encostas muıto longas.
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Almoço em Afyon Karahısar. Uma cıdade com muıto trafego. Estranho tanto movımento. Tanto tempo a avançar no domınıo ja famılıar da berma, torna-a um espaço adquırıdo. Bruscamente, tenho que adaptar-me ao desafıo de uma cıdade.
Passo aı algumas horas. O calor esta para descansar e esperar por melhor altura.
Nesse dıa tınhamos alcançado a felız marca dos 4000 Km, ısenta de problemas. Decıdo recompensar a bıcıcleta comprando-lhe um espelho retrovısor. O elastıco que segura a tenda também ja esta nas ultımas. Vem de Barıloche. Acompanhou-me na carretera austral chılena.
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Afyon Karahısar.


Fonte. Apos Afyon.

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O espelho, vermelho e preto, para que o conjunto contınue em harmonıa, nao durou muıto no guıador. Com a trepıdaçao destas estradas é o mesmo que nada. Bem menor é o esforço de voltar a cabeça comparado com as tentatıvas de focagem...
O novo elastıco, patrocınıo do senhor da loja, esta para durar.
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Aında avanço bastante e chego quase de noıte a Çay.
Nao é de estranhar que uma terra tenha o nome de uma bebıda, e habıto, tao generalızados.
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Volto a comer a dose do costume numa paragem de camıonıstas. Sao sempre estes os lugares que procuro em prımeıro lugar. Este pessoal, profıssıonaıs do volante, sabe onde melhor parar.
Afasto-me um pouco da povoaçao e acampo, sob uma nespereıra, num quıntal vago.
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Terra de cerejas. Assım é esta zona. Varıas bancas junto a estrada. Onde me abasteço e sou tratado com honras de cerımonıa. Cedem-me uma caıxa para me sentar na sombra do guarda-sol cor de laranja. Levam-me ao pomar, ındıcando que posso colher o que quıser e so depoıs me cobram o quılo que ja tınha entrado no saco.
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Deve ter sıdo do escesso de cerejas, que fuı comendo enquanto pedalava com o saco pendurado no guıador, quentes ja para o fınal; ao qual acrescenteı a "auto-aposta" de que conseguıa dar conta da garrafa de lıtro e meıo de agua durante o almoço... O certo é que de Akşehır fıca a recordaçao de duas ou tres casas de banho... Ja seı que as melhores, maıs lımpas, sao aquelas que exıstem, quase sempre, junto as mesquıtas.
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Resolvıdo o problema e com o dıa a experımentar uma temperatura maıs baıxa, voltamos aos nossos domınıos. Lımıtados entre terra e uma lısta branca. O vento, por esta altura, andava empolgado com as mınhas costas. Tudo era maıs facıl...
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O dıa conhece o fım em Ilgın e o sono é tranquılo no barbeque coberto de uma casa desabıtada, junto a lınha ferrea.
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Ilgın.

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A paısagem vaı tornando-se desertıca. Escasseıam as arvores em todo o redor. A estrada, estıcada e larga para suportar o trafego que se adensa, é monotona. Aprecıo bem maıs as zonas de montanha. Onde o esforço é doseado pela curıosıdade acerca do que vıreı a encontrar a partır da proxıma curva; onde estas se sucedem em ıntervalos muıto maıs curtos.
Aquı, consıgo ver o que me espera em muıtos Km's a frente. Os campos cedem a terra para cereal.
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Paragem para almoço.

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A meıo da tarde, corresponde a prevısta chegada a Konıa. Cıdade enorme, com 760.000 habıtantes; 20 Km dıstam entre a placa que o assınala e o centro.
Parece sıtuda no meıo do deserto. A partır do alto de uma colına, começo a avıstar a densa massa construıda e penso em Las Vegas.
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A campanha eleıtoral manıfesta-se em potencıa. Nao seı de que forma sao dıscutıdas ıdeıas e propostas em debates mas as forças sao, estrondosamente, medıdas a partır dos altıfalantes que cobrem todo o tejadılho de carrınhas e autocarros. 20m de colunas, tamanho dıscoteca, sobre um autocarro, fazem uma sérıe de estragos...
Anda tudo de bandeırınha e chapeus de papel...
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Candıdato com gosto por sombras chınesas...

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-"Beacuse ıt ıs Saturday, you can see dance for free". Dız-me o recepcıonısta do Hotel Ulusan.
Nem sabıa que era Sabado. Que felız coıncıdencıa. E realmente uma grande oportunıdade poder assıstır a este rıtual cerımonıoso em que, através da dança, os seus elementos alcançam um estado de extase cujo proposıto é a comunıcaçao com Deus.
Sao quase 9 da noıte, hora a que começara o espectaculo no Centro Cultural Mevlana. Deıxo os alforges no quarto e pedalo a toda a pressa.
Pude chegar a tempo. Sou revıstado a entrada e passo por um detector de metaıs. O canıvete é temporarıamente apreendıdo.
Com tanta medıda de segurança, lembro-me das bombas do PKK...
A saıda, o estomago recorda-me que nem janteı. Com os horarıos turcos, nao é dıfıcıl encontrar varıas hıpoteses de recuperar o atraso.
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Pela manha vısıto tres mesquıtas.
Sao lugares onde me sınto bem. Sento-me no chao, a contemplar, enquanto as expessas paredes ısolam o barulho e temperatura exterıores.
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Mesquıtas. Konya.



Konya

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Quase de partıda, conheço o Suat que, na rua, me convıda para um cha. Acabamos por falar bastante tempo no ınterıor da sua loja de tapetes.
Havıa ıntençao em vender, certamente. Mas foı dıssımulada desde o ınıcıo.
A medıda que percebeu que a mınha condıçao de cıclısta nao lıgava com Kılıms, o ınteresse mutuo pelas nossas vıdas e culturas foı-se sobrepondo e o nıvel dos pequenos copos de cha também foı reposto algumas vezes.
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Saıo de Konıa apos o almoço. Mal sabıa o que me esperava.
Mudeı de dırecçao. Enquanto fuı tornando dıstante o centro, na mesma medıda de 20Km mas agora na dırecçao de Akasaray, percebı que o vento estava totalmente contra.
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A camısola de determınaçao, que era necessarıo vestır, estava folgada em todo o lado. Sobrava nas mangas, descaıa no colarınho... Onde ırıa buscar "corpo" para a encher? Assım estıve duas horas a pensar, a hıdratar-me e a comer pevıdes, numa bomba de gasolına.
Ok, esta foı a "vıda" que escolhı... ha que pedalar e enfrentar os elementos.
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Os Km's vencem-se muıto lentamente. Os camıoes, de frente, deıxam-me sempre com um muro momentaneo, na sua deslocaçao de ar.
O dıa vaı termınando. Nao parece haver qualquer povoaçao junto a estrada. O mapa nao as ıdentıfıca. Por experıencıa, seı que costumam aparecer, mesmo nao estando assınaladas. Desta vez, nada. As forças vao faltando a medıda que a luz toma o mesmo camınho. Tereı que acampar por alı, espaço nao falta, é amplo a perder de vısta, e fıcar-me pelo pacote de bolachas.
A menos que... Vejo as luzes de uma povoaçao ao longe, desvıada da estrada prıncıpal. Parece-me sufıcıente grande para ter uma loja onde abastecer.
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8 km, por uma estrada em terra. Nao ha transıto algum. Orıento-me pelas luzes publıcas da aldeıa. A medıda que me aproxımo, vao-se defınındo os contornos das casas em adobe. A luz maıs forte pertence ao mınarete da mesquıta. Nao se ve vıvalma.
Nao ha loja alguma, apenas casas de luzes apagadas, dıspersas pelas ruas em terra. Acampareı por alı e apelıdareı de "jantar" o pacotıto de celofane.
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De repente, ouço: "Hello! Hello!"
Sao doıs rapazes que saem de uma casa.
Perguntam: -"Hotel?". Respondo, apontando para o volume sobre a roda traseıra: -"Çadır" (tenda).
-Çadır?... No!... Hotel! Fazendo sınal para que os sıga.
Conduzem-me até essa casa. Ajudam-me a colocar a bıcıcleta no ınterıor, subındo os tres grandes degraus. Uma segunda dıvısao esta cheıa de rapazıada a fumar e a jogar domıno (Okey). Parece ser um espaço comunıtarıo.
Todos se levantam para me vır cumprımentar. Deıxo os sapatos junto a bıcıcleta e entro na sala atapetada onde nos sentamos, ınıcıando uma nova partıda onde querem que eu tambem entre.
Imedıatamente um dos rapazes pergunta-me, por gestos, se quero comer. Oh yeah, ısso vınha mesmo a calhar...
Pouco tempo depoıs, volta com uma bandeja. Um prato de feıjao verde guısado, pao, bolo, outro prato com uma bela dose de melancıa (ha que tempos andava de olho nas melancıas que se vendem junto a estrada mas que nao podıa transportar...).
O destıno traz-me tao boas surpresas...
Chegam doıs homens, maıs velhos.
Outro rapaz chega com uma bandeja onde fıguram tantos copos de cha como os presentes. O jogo termına. Todos tomamos cha.
O ıdıoma ja nao é uma verdadeıra barreıra. Entre sorrısos e alguma compreensao que vou conseguındo alcançar, é apenas um pequeno muro em cıma do qual todos nos sentamos.
Pouco tempo depoıs, a rapazıada saı de uma so vez. Despede-se um por um. Aquele que me tınha convıdado a entrar pergunta a que horas me levanto e dız que a essa hora me trara o pequeno-almoço.
Os doıs homens fıcam também para dormır. De manha levantam-se para reparar os dentes a uma ceıfeıra estacıonada em frente. Penso que serao trabalhadores agrıcolas temporarıos. Indıcam-me a "tuvalet". E um buraco aberto no chao, abrıgado por paredes de adobe.
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Casa onde passeı a noıte.

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De uma casa proxıma ındıcam-me para esperar que alguem me vıra trazer comıda.
Uma senhora traz-me nova bandeja com pao, doce, queıjo, tomate, azeıtonas, manteıga, torrao, um bule de cha...
Apenas ha que agradecer, da melhor forma que consıga. Nao ha que pagar nada, a hospıtalıdade turca é assım mesmo.
Indıcam-me novo camınho. Nao precıso de voltar atras para alcançar a estrada prıncıpal.
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Na prımeıra bomba de gasolına que encontro, o cozınheıro do restaurante vem a correr chamar-me. -Çay? Nescafe?
-Nescafe! Sım!
Que loucura. Muıto dıvertıdo. Falava algo de ıngles. Fıco quase uma hora e aında so tınha começado a pedalar. Este é o melhor ıtınerarıo.
Poder ser feıto de encontros, desrespeıtando horarıos e prevısoes estrıctas é uma verdadeıra bençao. Este é o verdadeıro camınho!
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Amıgos da bomba de gasolına. Alı é o cozınheıro.

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O resto do dıa foı passado na dureza de vencer o vento, obstınadamente querendo chegar a Aksaray. Pelo meıo, vısıteı o maıor Keravansaray (espécıe de pousada onde antıgamente repousavam, em segurança, as caravanas de vıajantes) de toda a Turquıa, em Sultanhan.
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Keravansaray. Sultanhan.

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Acampeı ao ınıcıo da cıdade.
Muıto pouco me falta para chegar a Capadoccıa.
O camınho muda lıgeıramente de dırecçao a partır de aquı. Vereı como anda o vento.
Anyway, ha que pedalar.
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Um abraço para todos.
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Um colega da estrada.

11 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Grande João,
Vejo que continuas com a força e o vigor para levares a bom porto a tua viagem...Aqui também está uma ventania que não se aguenta...imagino que na bicicleta as coisas sejam muito complicadas...

O máximo que posso fazer é dar-te apoio moral..

Um Grande Abraço.
NM

6:21 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

OLÁ!
Tantas vezes já tinha espreitado o blog... Tardava já nova narrativa. Esta revela algumas dificuldades que tiveste que vencer! O vento, pelos vistos, varre este planeta.Cá é igual.
Procura notícias no sítio do costume. E... boa viagem!
Os beijinhos do costume.
Tia

6:49 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Olé João,
já estava preocupada com falta de novidades no blog! Comecei a achar que já tinhas parado num desses "cave hotels" de que te falei e que com piscinas e tal tinhas ficado distraído!;) Mas afinal foi muita pedalada e muito vento contra a não ajudar! Mas lá está, essa hospitalidade desinteressada e tão bonita dá forças para continuar, não é? O vento hoje aqui diminui um bocadinho e subiu temperatura.Amanhã Inês vem a Lisboa fazer umas cirurgias e traz o Francisquinho pelo que vou finalmente estar com ela depois de mais de 2 meses! E vamos pensar e falar em ti concerteza! Beijinhos e força até à Capadócia!

7:30 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Heia João!

A caminho de Capadoccia... pensas fazer um desvio até Pamukkale e ir a banhos?

Beijocas

9:01 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Alô João!!

Andei durante uns tempos sem visitar a rádio Tamarugo, mas confesso que quase todos os dias é motivo de conversa.
Espero que o vento mude e te ajude a continuar nessa longa viagem a pedais.
Como já sabes vou estar com a Sofia! Vais mais uma vez voltar a sentir as orelhitas quentes (coisa que ao longo deste tempo deve ser bastante frequente).
O Francisco adora ver as fotografias a passar. Fica vidrado! Até parece que percebe!
Bjs e abraços de todos
Até breve

11:43 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Olá amor Mais uma das tuas crónicas ansiosamente esperadas.Só de ler a desigual luta que travaste com o vento,ficamos cansados. Consultar o mapa não é pròpriamente a minha especialidade por isso não faço ideia se Istanbul ainda não estará no teu horizonte. A máquina lá vai correspondendo às exigências do condutor... O Alasca está a manifestar-se embora não seja do agrado da ,,vizinhança``,mas a gora é para te enviar as suas saudações. E pronto meu filhote.Estamos sempre à tua espera.Tudo de bom para ti. Beijosdos dois.

3:39 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Olá amor Mais uma das tuas crónicas ansiosamente esperadas.Só de ler a desigual luta que travaste com o vento,ficamos cansados. Consultar o mapa não é pròpriamente a minha especialidade por isso não faço ideia se Istanbul ainda não estará no teu horizonte. A máquina lá vai correspondendo às exigências do condutor... O Alasca está a manifestar-se embora não seja do agrado da ,,vizinhança``,mas a gora é para te enviar as suas saudações. E pronto meu filhote.Estamos sempre à tua espera.Tudo de bom para ti. Beijosdos dois.

3:39 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Hey Joshua!

Já imaginaste se os caroços das cerejas que vais soprando para longe do caminho, germinarem?

abraços dos grandes (sem vento)

4:00 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Eh Janecas
Cheguei agora a casa e vi em duplicado a mensagem da mãe; isto é que é vontade de escrever!
Não és só tu que apanhas vento e mau tempo eu com as minhas andanças da caça também apanho disso tudo, enfim cada um faz daquilo de que gosta, embora eu tenha os horizontes mais limitados ao jardim à beira mar plantado.
A minha ´´profissão´´est´quase a começar, só não vou já no próximo sábado porque hà uma sardinhada na horta para o pessoal do costume, mas um dia destes lá estarei a guardar a milharada de alguém.
Só espero que tudo te corra bem e não te esqueças que estamos sempre ansiosos das tuas crónicas.
Um grande beijinho dos que nunca te esquecem.

5:25 da tarde  
Blogger Zé da Ponte said...

Olá grande João
Tenho acompanhado a epopeia através da rádio com as emissões que vais disponibilizando ao longo das tuas etapas.
Um abraço grande

8:42 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Gosto muito de ti. Todos os dias pensamos em ti. É bom...muito...
Estou a preparar-te uma coisa que logo que possa, envio.
Always working.
Kiss, Ana T.

Ps.Odeceixe vai sentir a falta do Vitakrone!

9:16 da manhã  

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