domingo, janeiro 22, 2006

Iquique


_Calle Baquedano

Agora, novamente com acesso a este terreno universal, onde toda a gente se encontra, é altura de voltar um pouco atrás e falar de Iquique, para manter a consistência do relato.
Continuo a agradecer todas as presenças, empurröes e os votos de "aguante".
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O primeiro dia (a grande fatia solar que lhe correspondeu) foi passado na internet, a actualizar este blog. De noite passeei pela Plaza Arturo Prat e ainda estive quase a ir ao teatro. Estava a decorrer um Festival Internacional. Infelizmente, a companhia argentina que estava anunciada cancelou a actuaçäo dessa noite e o mesmo horário foi compensado com uma peça infantil.


_Plaza Arturo Prat
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Jantei no estabelecimento do Sr. Schiller - "comidas al paso" - Ensalada, chancho (porco) com puré e um néctar da marca "Watts" (nos quais estou practicamente viciado. Se a mesma chega a Portugal, a fábrica de Almeirim que se cuide).
Uma refeiçäo, assim completa e ainda com direito a "postre", (gelado ou fruta) custa, nos sítios mais baratos como este, 1900 pesos (1 euro = 590 pesos chilenos).
Perguntei-lhe se ainda existia a "Escuela de Santa Maria", onde me dirigi, após confirmaçäo.
Situa-se em frente ao mercado. Em redor de este existem restaurantes ainda mais baratos do que aquele em que comi mas com aspecto menos agradável.


_Mercado de Iquique

A curiosidade pela escola vinha de um texto que tinha lido e que atribuia a este lugar o facto de ter sido palco de um dos mais sangrentos episódios ligados à época do nitrato.
Em 1907, cerca de 8500 manifestantes das "salitreras" aí chegaram, adensando este ponto de concentraçäo em protesto contra o desemprego e as parcas condiçöes de trabalho. Quando recusaram abandonar a escola, a polícia e o exército carregaram sobre todos estes elementos, desarmados, com metrelhadoras. Houve centenas de mortos e um número bem maior de feridos.
Um grupo folclórico chileno (Quilapayún) imortalizou este incidente num álbum entitulado "Cantata popular Santa María de Iquique".


_Escuela de Santa María
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Na manhä do dia seguinte, em bicicleta mas sem as "carenagens" que a revestem de peso e aumentam as condicionantes de desafio do equilíbrio, fui conhecer a Zona Franca (Zofri). Fica a cerca de 3 Km a norte da cidade, junto ao mar e a fábricas de farinha de peixe.
Existe um enorme edifício que alberga um sem número de lojas de electrónica, roupa e artigos de "tuning". Em redor existem stands de automóveis novos e, em outras ruas, um "mercado" contínuo de espaços de venda de automóveis usados, importados da China e do Japäo. Vêm com o volante à direita mas os chilenos já se tornaram especialistas na "conversäo". O tablier é cortado e as duas metades trocam de posiçäo. Dizem que, com a prática, a mestria da montagem é tal que nem se nota e que o problema só surge se o veículo acaba por vir a transitar muito em estradas menos boas. Os barulhos que aparecem acabam por denunciar a adaptaçäo.
Também há quem importe só motores e no chäo de enormes armazéns deixa de haver lugar para mais. Ou portas dispostas em prateleiras de vários andares, eixos com diferencial, farolins, motos e até... bicicletas japonesas com motores eléctricos. É todo um "amontoado" de veículos e peças em ruas compridíssimas, que assistem a um constante movimento de camiöes a carregar, com destino ao norte, sobretudo Bolivia. Para que o reboque possa permitir algumas sobreposiçöes, aos carros que estäo por baixo säo-lhes desmontadas as rodas, indo apoiados apenas nos discos dos travöes. As frentes tocam com as traseiras. Com o movimento, näo sei em que estado chegaräo aos locais de destino (os riscos laborais, na Bolivia, näo devem chegar perto dos bate-chapas e pintores).
Nas esquinas há lanchonetes, com bancos corridos resguardados do sol por toldos coloridos.
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Mais parte, tomei a direcçäo sul, a das praias.
O mar é o único elemento comum entre esta e a caótica e "metálica" zona da manhä.
O areal é muito branco e povoado como manda a tradiçäo dos veraneantes que näo dispensam o mar, nem o sol, e marcam com uma cruzinha de "supérfluo" toda a roupa que näo seja elementar.
Há palmeiras estilo "Beverly Hills", áreas ajardinadas, um mini-zoo, gratuito, com lamas e um grande aquário com dezenas de jacarés.





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Ando um pouco "pressionado" aqui pelo moço da internet. Acho que quer ir fazer uma sesta e, entretanto, juntar as duas portas azuis. Já lhe perguntei, diz-me que näo. No entanto, näo pára de andar de um lado para o outro com cara de sono e impaciência.
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Voltei ao centro da cidade, já näo pela marginal mas pela base da grande colina de areia que "protege" o lado Este de Iquique. Aqui existem casas bastante mais pobres, nada tendo que ver com as cadeias de restaurantes internacionais e o arranjo dos espaços públicos junto às praias. Todas as ruas têm um só sentido, alternando estas direcçöes numa rigorosa planta ortogonal. Este é um esquema comum a todas as povoaçöes por onde tenho passado e também àquelas que me recordo da Argentina. Por isso as indicaçöes säo dadas em: "una, dos, tres cuadras" (cuadra = quarteiräo).
Proliferam os "almacenes" (mercearias), criativos negócios de lavagem e aspiraçäo de carros (à porta de casa), oficinas de automóveis e também uma empresa de fumigaçöes com o elucidativo slogan de "matamos por encargo".







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O investimento gastronómico da noite teve como destino, de novo, as floridas mesas do Sr. Schiller. O seu bisavô foi um marinheiro alemäo que desembarcou e viveu no arquipélago Juan Fernandéz (fica, + ou -, frente a Santiago, tornando-se popular por aí ter estado Alexander Selkirk, a inspiraçäo de Daniel Defoe para a criacçäo da personagem de Robinson Crusoe).
Ele, o meu interlocutor das refeiçöes, nunca foi às ilhas. Aliás, pouco saiu de Iquique, por opçäo. Estudou engenharia química em Antofagasta e, mal terminado o curso rumou de novo a norte. Faz projectos para as minas e abriu este pequeno restaurante para preencher os períodos em que tem pouco trabalho. É a mulher quem cozinha. Foi ele que a ensinou, até esta desenvolver os dotes e o superar na ciência.
Diz que, na família, entre irmäos, säo quatro rapazes e uma rapariga. Quando saíram de casa, para estudar, todos os rapazes sabiam cozinhar, menos a irmä. Porque todos pescavam e passavam temporadas na praia onde tinham que cuidar da "sobrevivência".
Näo se cansa de tecer elogios a Iquique. O tempo é bom quase todo o ano, é a única cidade chilena onde há recolha diária de lixo, existem equipas de saúde, com carrinhas, que, num esquema de rotaçäo, estacionam nos distintos bairros servindo, gratuitamente, cuidados de odontologia e exames relacionados com doenças femininas.
Também referiu os benefícios relacionados com a zona franca e os cerca de 10.000 empregos que esta sustenta (divididos por mais de 1500 companhias), fazendo com que Iquique detenha o feliz record chileno da taxa mais baixa de desemprego.
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Ainda andei pela peatonal calle Baquedano a averiguar sobre os gelados mais baratos. Tanta escolha, tanta procura e acabei por vir a comprar um sabor que tinha bocadinhos de bolacha iguais aos mesmos que ando farto de comer nos dias de "ruta".
Comprei um mapa de estradas (que aqui se chama "guia caminera") e um belo livro, na rua, de Hernan Rivera Letelier (escritor chileno, criado numa salitrera) que, à boa maneira sul-americana, possui o inigualável dom e sensibilidade sul-americanas de juntar palavras e de nos levar com elas.

7 Comments:

Anonymous Anónimo said...

OLÁ João! Tu contas as tuas aventuras e eu não resisto a saudá-las, ainda que desta vez já um pouco ensonada, após várias horas frente à emissão eleitoral, que nos ditou Cavaco em Belém, como era previsto.
Já tinha sentido a falta de mais uma crónica. Soube que deste notícias ontem e que tudo está bem contigo.
Já sei muitas coisas do país, não só as que tu contas , mas também as que vou pesquisando na net, para saber mais ou menos onde estás. Julgava-te em Tocopilla, segundo ter percebido pela tua mãe.
Que continues a fazer boa viagem e a cuidar-te bem!
Muitos, muitos beijinhos meus e do tio

3:50 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

juan:
espero que ao fim de tantas tentativas na posicão «espojado»e depois de teres ouvido o piropo de «ay que hermoso«(omitiste a idade da guapa,lapso?te lembres que essa pode ser uma posição bem vantajosa!como o acesso a este blog é do dominio publico,não vou entrar em detalhes,pois sei que já alcançaste.
mudando de assunto se for um chicco se llamara joselito.

um grande abraço,boa saude e tudo de bom

9:33 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

já depois de te ter deixado esta mensagem,ao ler a dita,notei que era um pouco confusa,espero que entendas que el niño seja produto totalmente "made in portugal"aseembled by Filipa and John. A historia da guapa,foi só para desonrientar os curiosos
Ah!Ah!Ah!

9:48 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Apesar de não te conhecer, e a mando da tua amiga Dania, deixo aqui o meu testemunho: Não há melhor coisa na vida do que vadiar. Declaro aqui a minha mais profunda inveja. Boa viagem e que bons ventos te guiem.... ou melhor... que os ventos amainem para facilitar as tuas andanças.

3:20 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Olá tamarugo.
aposto na tua viagem e no prazer de ver as tuas fotos que são belas.
Viajar dessa forma parece ser mar-avilhoso,sem "imbambas" atraz é o
maximo.
Não te percas e volta para contares o resto.
Um abraço e até breve
jbarriga

2:09 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Olá Joãzinho!

que aventura, hein?? que saudades da Argentina ao ler partes do teu diário..ao ver a foto de la boca...

eu, entretanto, já sou mãe :) de um lindo menino que nasceu no dia 27 de janeiro! Já passou quase um mês... o tempo passa a uma velocidade atroz... correu tudo bem e foi parto natural. Correu bem esta minha viagem :) regressei a casa com um duendezinho muito fôfo!

Espero que todas as pessoas com que te cruzes sejam as melhores desse país-como me desejou um portenho mal aterrei em Buenos Aires :)

Um beijinho grande de sagres, carla, tiago e Miguel

3:02 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

ola , gostaria por gentileza de saber um tel ou email de lguem la em iquiqui que pode me orientar sobre peças de veiculos diesel novas, mito obrigado.
jarbasojr@hotmail.com

12:53 da tarde  

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